foi dito no rodapé que todas as mulheres deveriam se dirigir ao palácio do governo sem sapatos ou meias ou luvas ou gorros. apenas um avental florido deveria cobri-las. os redatores da concorrência não hesitaram em ignorar, ou simplesmente desaperceber inocentemente, como crianças em peça de teatro que se surpreendem de fato com os elementos-surpresa que entram por trás da plateia, a ironia suicida que ali nascia e ali morria, ao engarrafar as letras DEMO em cracia, seguidas pelo mais polêmico ponto de interrogação dos últimos anos.
o encontro se daria às duas da tarde do mesmo domingo em que se lia a bomba. todos deveriam almoçar suas carnes e arrozes e feijões requentados ansiosamente. e ir.
os aventais floridos sumiram das lojas. os orgulhos dos maridos enfiaram a cabeça no buraco do ralo do banheirinho. as bundas de todas as mulheres de todos os lugares reuniram-se, nuas, no mesmo lugar. os rostos abatidos envermelharam-se todos, sérios, lacrimejados. o governo, assustado, após alguns minutos de ruídos desesperados em telefone-sem-fio, mandou todos para casa imediatamente. o jornal, em poucas horas, calou-se para sempre.
finalmente, a primeira notícia do dia, no jornal das seis da manhã, na voz feminina da mulher bem-vestida de cabelos curtos:
"a semana que se segue será a mais agitada de todas: faltam apenas 9 dias para o natal!"